Consumidora apaixonada, marketeira decepcionada
ou também posso descrever como a visão de curto prazo e a visão de longo prazo
Primeira news pós-férias. O formato está diferente e isso para deixar a leitura mais leve. Com dezembro batendo na porta tudo o que a gente quer é curtir os dias em uma bela piscina, com refrescos, amigos e coisas leves. Então aqui vai uma news leve, mas espero que ainda rica em insights, para inspirar o seu final de ano e te fazer sonhar com as coisas possíveis de realizar em 2024. Tá longa pq eu coloquei muita imagem para ajudar na construção da análise com vocês :)
🎯 Objetivo: uma análise selvagem de uma marca de roupa com duas óticas - a de consumidora e a de profissional de marketing.
📖 Flow de conteúdo:
Parte 1) Dora consumidora
Parte 2) Dora profissional
Parte 3) Conclusão
Parte 1 - Dora consumidora
Estava caminhando despretensiosamente pela rua e uma loja de esquina me chamou a atenção. A arquitetura era um dengo, parecia uma casa de bonecas sofisticada. No lado esquerdo estava a vitrine. Cheia de peças únicas que pareciam a minha pasta de looks se tornando vida real. A porta de entrada estava fechada, era grande, preta com umas bolas douradas e logo acima estava escrito Sister Jane. Resolvi entrar.
O primeiro andar era um café, mas parecia um bar. O lugar estava meio escuro, ninguém atendia o suposto café e tinham algumas pessoas trabalhando com computador nas mesas. Fiquei confusa e pensei: Será que a porta estava fechada porque aqui não é uma loja? rs.
As pessoas que trabalhavam ali perceberam que eu estava perdidinha, quase indo embora até que alguém falou "lá em cima é onde ficam as peças de roupa! pode subir".
E foi ali, no andar de cima, que eu me apaixonei de vez. Era uma surpresa a cada esquina, detalhes muito bem trabalhados no espaço e nas peças. Uma estética coerente e impecável.
O design das peças eram tão únicos que eu literalmente não conseguia fechar a boca e parar de falar "meu deus, que coisa LINDA".
Ali, por todos os estímulos, eu fui impulsionada a sonhar. A me sentir desejada, a me sentir autêntica e chique. No provador, cheio de espelhos e luzes, me senti no centro de uma enorme galáxia, uma verdadeira narcisista sendo vangloriada (rs). Já me imaginei arrasando nas festas de natal e ano novo com os looks pq sim, eu sou dessas que vive para chocar com o inédito.
Há tempos ando reclamando que o mercado de moda está chato. Marcas cada vez mais parecidas em produto e em posicionamento. E se é diferente, tem um ticket médio caro, maior que R$600,00 a peça. Para mim era óbvio que Sister Jane estaria no segundo cluster.
E para choque de todos, Sister Jane é uma exceção a essa regra da minha cabeça. Fazendo todas as conversões, o preço é em linha com as peças mais “premium” da ZARA, um ticket de R$ 350/400 para as t-shirts, por exemplo. Longe de ser barato mas pelo design e qualidade da peça, vale a pena o investimento.
Me apaixonei ainda mais e saí de lá determinada a estudar a estratégia.
Parte 2 - Dora profissional
A minha percepção inicial estava certa. Sister Jane ocupa um lugar no mercado que até então estava vazio: roupas extravagantes e glamourosas a um ticket médio não exorbitante. O fundador descreve que a consumidora da marca é aquela mulher que defende a sua individualidade e a expressa através dos looks. É um tanto romântica, independente e sabe exatamente o que quer, principalmente quando se trata de roupas. Para atender esse público a estratégia de design é clara: peças autênticas e com uma excentricidade extravagante.
"Sister Jane é uma marca londrina com romance e nostalgia no coração. Nunca tranquilos, combinamos a excentricidade extravagante com uma assinatura de estilo distinta. As peças enfatizam detalhes únicos e inesperados que são coloridos, frescos e modernos, ao mesmo tempo em que carregam um toque retrô."
Para dar conta de peças tão únicas e cheias de detalhes, a produção não pode ser em massa. O volume é reduzido, as coleções são lançadas a cada 6 semanas e a lógica é de que cada peça é uma jóia de edição limitada.
Com esse contexto, um alerta já explode na minha cabeça: como a conta fecha se o volume de venda [parece] é menor e o ticket por peça não é elevado? Claro, podemos pensar em algumas respostas como frequência e itens por compra, mas é aqui - nessa equação de negócio - que a estratégia de posicionamento tem a sua função principal e oportunidades aparecem para Sister Jane.
Todo o storytelling da marca é baseado no design dos produtos e a sua estética. Isso é importante? Sim! Mas não só. Vamos sempre lembrar que produto é facilmente copiavél … alo alo dupes e senhora Shein.
A marca está falhando em criar uma história maior por trás daquilo que entrega, envolvendo o consumidor com algo que vai além do produto garantindo, assim, uma percepção de valor maior que garante a sua elasticidade em preço e negócio. Para os fãs do Golden Circle, está faltando responder ao grande por quê.
Por que romance e nostalgia do retrô são importantes para construção das peças?
Qual o seu ponto de vista sobre moda nos dias de hoje? Para que a moda serve?
Por que é importante ter um design tão único, excêntrico?
Responder essas perguntas têm impactos significativos para o sucesso da marca no longo prazo. Os 4 principais:
1- Garante sua relevância no tempo. Como discutimos nessa news, o design reflete a visão da marca sobre moda e, por isso, se atualiza, não é estático.
2- Possibilita a expansão da marca para outras categorias, aumentando sua projeção de receita. Lembra da Amazon, aquela empresa de logística que entregava livros? Pois é, ficaram sabendo do salão de beleza que ela abriu na Inglaterra focada no cuidado capilar?
3- Aumenta a identificação com a marca. Insere outros temas de diálogo com o consumidor que transcende o produto. Esse gráfico da Interbrand nos ajuda a valorar, em termos de receita, a importância disso:
4- Aumenta a percepção de valor da marca. Preço não é apenas um cálculo matemático, ele é a consequência de um posicionamento bem feito. Esse estudo acadêmico nos ajuda bem a entender isso:
Este estudo de 2004 foi financiado pela London Business School e conduzido pelo professor Mark Ritson da London Business School, pelo professor Richard Elliott da Warwick Business School e por Helen Edwards da Leicester University.
Quinze entrevistados foram selecionados com base em dados demográficos e na força de sua lealdade a uma gama representativa de marcas. Essas marcas foram então retiradas de suas vidas por um período de seis semanas e substituídas por marcas genéricas. Marcas avaliadas:
Os entrevistados foram entrevistados antes, durante e depois do período de privação, e todos mantiveram diários de áudio da sua experiência. Embora todos os entrevistados tenham indicado o desempenho superior do produto como motivo de fidelidade antes do ensaio, muitos concluíram que as alternativas genéricas tiveram um desempenho igualmente bom e, em dois casos, melhor – mas todos os entrevistados retornaram à sua escolha de marca original após o estudo.
Parte 3 - Conclusão
Me apaixonei por tudo aquilo que a loja e as peças me fizeram sentir. Fiquei decepcionada ao perceber que a marca, com tanto potencial, não conseguiu captar essas sensações e traduzir em um posicionamento que transcende o produto. Alô Alô CEO, bora evoluir essa estratégia que Sister Jane tem o potencial de conquistar o mundo! Vocês também acham??
Bjo Bjo e até a próxima.